Por Fatima de Kwant
Quem tem um filho autista conhece aquele sentimento de culpa que bate, na época em que começamos a nos preocupar com o desenvolvimento do nosso filho: “O que foi que eu fiz?” Sentimento de culpa antes, durante e depois do diagnóstico do autismo.
ANTES
Você está na sala de espera do consultório do pediatra, lotado de mães com filhos de várias idades. Enquanto as outras crianças sentam nos colos de suas mães, ou brincam na mesinha de jogos num canto da sala, o seu filho faz um escarcéu. Ele, simplesmente, não para quieto; corre, senta no seu colo, desce do seu colo, pega o brinquedo das mãos da criança ao lado, joga os bonequinhos de pelúcia no chão, pula, abana as mãos e mais um monte de estranhezas. Você segura a respiração e pensa: “O que esse menino tem, meu Deus?…” seguido de “…mas o que foi que eu fiz para ele ser assim?…” Obviamente, a culpa é sua.
DURANTE
Um diagnóstico não é dado, assim, de repente. Antes do laudo, há todo um processo de exames, testes e observações clínicas. Durante este período, você não faz outra coisa senão pensar no que foi que você fez de errado. “O que meu filho tem? Será que é autismo?” Você já leu tudo sobre autismo, se juntou aos grupos de Facebook e de Whatsapp só para saber se seu filho se encaixa. Às vezes sim, às vezes não. De todas as formas, ele não se enquadra nos padrões normais e isso sem dúvida, é culpa sua.
DEPOIS
Aí, depois desses meses de estresse, vem o laudo fulminante e imperdoável: TEA – Transtorno do Espectro do Autismo. E agora José? “O que é que eu fiz de errado???”… Você, agora, está ABSOLUTAMENTE CERTA de que a culpa do autismo é sua!
“Você mimou muito esse menino, só podia dar nisso”… “Você não devia ter fumado durante a gravidez”…” A sua família está mesmo cheia de gente doida…” “Vai ver que foi essa dieta maluca que você faz”…” Você devia ter parado mais em casa; a criança nem te conhece!” … “Você devia ter…”
Junto a tantos comentários sem noção (sem noção, mesmo), você ainda encontra respaldo em alguns artigos científicos, mostrando que o que causa o autismo é algum trauma, lactose demais, a sua asma, antidepressivos, a sua idade no momento da concepção, a falta de ácido fólico nos três primeiros meses de gravidez, o glifosato que você consumiu sem saber estes anos todos, e mais um monte de coisas que VOCÊ deve ter feito.
Convencida de que a culpa do autismo do seu filho é sua, você sofre, intensa e duplamente: por ser a mãe de uma criança que você gerou mas não conhece, e pela péssima mãe que você é, pois a culpa do autismo do seu filho é sua.
Certo? Errado.
Se você (ainda) pensa que tem culpa no cartório, pare agora. Vamos esclarecer um fato importantíssimo: a culpa do autismo não é sua. O autismo tem uma forte base genética, complexa, explicada por alguns cientistas como mutações raras, com grandes efeitos, e por outros cientistas como interações multigênicas raras de variantes genéticas comuns. A complexidade surge devido a interações entre múltiplos genes, o meio ambiente e fatores epigenéticos que não alteram o DNA, mas que são hereditários e influenciam a expressão do gene. Ufa… Em outras palavras: a culpa do autismo não é sua – nem do seu marido e dos genes que vocês herdaram. A mistureba quem fez não foi você. A “culpa” é da natureza, que sempre sabe o que selecionar para preservar sua evolução.
Sim, você já parou para pensar que o autismo também pode ser uma forma alternativa de sobrevivência do Homem? O autismo vem aumentando bastante nos últimos anos e isso não se deve, somente, a diagnósticos precoces. Quem convive diariamente com o autismo, sabe que existem vários “autismos” e várias causas para que se manifestem. Vamos falar sobre o tipo que não tem razão aparente. O autismo que nasceu sem a evidência genética, de pais e mães jovens, cujas mães tiveram uma alimentação saudável – rica em ácido fólico, ômegas e todos os minerais que afirmam ser risco para o autismo.
A quantidade de crianças no espectro é tão grande que obriga a sociedade a se adaptar. Isso vem acontecendo aos poucos, mas progressivamente. As escolas, os hospitais, nossos amigos, quase todos já estão sabendo o que é autismo ou conhecem alguém autista. As pessoas à nossa volta já não mais ignoram o autismo. Pelo contrário, descobrem métodos cada vez mais eficientes de fazer contato com os autistas, tal que eles, mais tarde, possam-nos explicar/ensinar a pensar de um jeito diferente, com um novo olhar para a sociedade do futuro.
Você tem muito trabalho pela frente, mãe. Você precisa criar uma criança que vai recriar o mundo. Não perca seu tempo se sentindo culpada. Invista no conhecimento e na descoberta da potencialidade do seu filho, criança única, maravilha da natureza que VOCÊ criou. Isso, sim, é “culpa” sua.
*Fatima de Kwant é jornalista e especialista em autismo na Holanda, desde 1985.
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somos companheiras de luta amiga!!fico feliz por estar ao teu lado!!beijos meus e do Eliseu,meu autista artista!
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Obrigada! 😀
Bjs,
Fatima