A dificuldade em iniciar e terminar tarefas
Por Fatima de Kwant
Holanda, 19 de junho, 2023.
Quem nunca adiou alguma tarefa que não queria fazer, ou uma situação que queria evitar? Quase todo mundo, certo? Mas, para algumas pessoas, esse adiamento (procrastinação) acontece com maior frequência e entre elas, pessoas com TEA, TDA ou TDhA.
As causas desse comportamento podem variar. Geralmente, decorrente de:
– Medo de falhar
Receio de cometer erros, por isso, evitar a tarefa, evita (possíveis) erros.
– Perfeccionismo
Não começar significa que não se corre risco de não estar bom o suficiente. Os perfeccionistas sofrem com a pressão interna de não poderem cometer falhas. ˜ão começar um projeto pode significar segurança.
-Prejuízo nas Funções Executivas
Dificuldade no planejamento, na organização, na priorização, de tomar iniciativa, de visualização do contexto geral (imaginar o resultado da tarefa).
– Falta de disciplina ou falta de motivação
Quando falta (auto)disciplina ou motivação intrínseca, fica difícil se movimentar em direção ao que deve ser feito.
No TEA, TDAH, existem causas como a falta de energia, muitas coisas que devem ser feitas em um só dia, ou dificuldade nas funções executivas, na organização e planejamento para começar e terminar uma tarefa.
Fato é que procrastinar custa mais energia ainda. É como se tivesse uma “aba de computador” aberta na cabeça, lembrando a gente que tem que fechar. Aquela sensação chata de “Ai, meu Deus, eu tenho que terminar minha monografia…” que fica martelando o cérebro, causando… ESTRESSE, ansiedade e diminuindo a energia. E muitas vezes a pessoa acaba tendo que fazer no último minuto, o que traz mais nervosismo ainda, e mais chance de a tarefa não ter ficado como ela queria. O inverso também pode ser verdadeiro, ou seja, a pessoa procrastina porque sente estresse, ou está em período de burnout.

Por isso é tão importante intervir nesse processo de ficar adiando o que é importante. A procrastinação é um comportamento aprendido, ou melhor, praticado que virou hábito, então, a boa notícia é desaprender. No autismo, a propósito não é fácil se livrar desse comportamento. É fundamental o terapeuta descobrir de onde vem esse comportamento, que pode ter outras causas que nas pessoas sem autismo.
Terapia
Explica-se para a pessoa autista, em primeiro lugar, os benefícios de ela ver suas tarefas cumpridas, o que pode não estar claro para ela. Comentários como “Poxa vida, você é tão inteligente! Como pode não ver que esse adiamento vai te prejudicar?” Lembre que essa percepção é sua, mas pode não ser ainda a do autista. O comentário, além de não ajudar, pode atrapalhar quando traz irritação ou estresse adicional de não se sentir compreendido naquilo que a pessoa autista sabe que é um problema, mas não sabe resolver sozinha.

Opção
Se uma tarefa é complexa, é sempre bom dividi-la em etapas.
Exemplo: Um trabalho de pesquisa da faculdade que não acaba.
Fazer tudo de uma vez vai ser bem difícil. Então, faça em etapas:
– Defina os temas
– Selecione sites onde vai explorar a temática
– Comece o dia já escrevendo algumas informações, ou uma página sobre o assunto
– Deixe sonar um lembrete no seu celular de que é hora de trabalhar no projeto
– Peça auxílio de seus pais ou amigo para te lembrar de fazer alguma coisa pelo projeto naquele dia.
– Deixe seu celular no modo avião para evitar distrações. Melhor ainda é manter o celular em outro aposento enquanto você termina a etapa do dia.
Uma técnica que tem dado certo é a de começar o dia por aquilo que você tem que fazer para que o resto do dia seja mais leve. Outro método que funciona muito bem é o da psicóloga russo, Bluma Zeigarnik. O método Zeigarnik consiste na premissa de que o ser humano se recorda mais facilmente daquilo que não está terminado ainda. Com isso, enquanto não se termina uma tarefa, mais se lembra dela (estresse). A solução seria começar de qualquer jeito, com pequenos passos, colocando palavras-chave em um mapa digital, por exemplo. A sensação de estar começando (naquilo que o cérebro vem martelando) é um estimulante natural para seguir com os passos. Terminar uma tarefa que fica remoendo na cabeça enquanto não é cumprida aumenta o nível de dopamina. A dopamina é um neurotransmissor, tb chamado de hormônio da felicidade, que aumenta a sensação de prazer, satisfação e aumenta a motivação. É nessa espiral positiva que a gente quer entrar, não é? Então, não vamos aceitar a procrastinação como fazendo parte, como “eu sou assim e pronto”, e tentar trabalhar nesse comportamento que virou hábito, para que você, pessoa autista, TDAH ou não, tenha melhor qualidade de vida e sucesso nas suas tarefas!

Fatima de Kwant reside na Holanda desde 1985, é jornalista, especialista em autismo, mãe de um jovem autista e ativista pelos direitos dos autistas.
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