Parte I
Por Fatima de Kwant
Rio de Janeiro, 7 de novembro, 2017
Pais e mães querem todos a mesma coisa: propiciar o desevolvimento progressivo de seus filhos. Para isso precisam fazer uso do poder que existe em cada um deles. Uma força interior imbatível; a força que vai fazer com que entrem na mesma sintonia que seus filhos.
O Poder dos Pais
Autismo é um trabalho de equipe, tendo pais, professores e terapeutas em alinhamento, comprometidos em encontar o melhor para o autista. Vemos pais e mães desdobrando-se para levar seus filhos a terapias diárias, quando não várias por dia. Indico que ao menos uma delas seja dada por eles mesmos (pais), todos os dias, se possível. A ideia pode parecer desagradável ou impossível, afinal, pais e mães não são terapeutas. Mas ser co-terapeuta do filho é mais fácil e prazeiroso do que se pensa, além do resultado obtido ser mais rápido e efetivo do que o acompanhamento único de terapeutas profissionais.
De modo algum devería-se descartar um tratamento ou acompanahmento por profissionais hábeis e experientes, como Terapeutas Ocupacionais, Fonoaudiólogos, Psicopedagogos, Psicólogos e demais cooperadores que contratamos para assitir nossos filhos. O bom entendimento com estes profissionais, e a liberdade para que pais e mães recebam sugestões deles, vai ser de grande ajuda nessa atividade que pais e mães irão abraçar.
Há três pilares fundamentais para que pais e mães tornem-se co-terapeutas de seus filhos:
– Foco
– Planejamento
– Empoderamento
Foco
Apesar da sociedade moderna esperar que todos sejam capazes de fazer o multitasking (exercer várias tarefas ao mesmo tempo) ou equilibrar varias “bolas” no ar, na verdade, para obter-se resultados excelentes, só o foco absoluto numa só atividade é capaz de trazer sucesso.
Você já viu um maratonista profissional parar durante a corrida para tirar um selfie? Já viu algum nadador de olimpíada perder cinco segundos para ajeitar a touca? Já viu um estudante entrar no chat enquanto faz uma prova final? Já viu um cirurgião parar de operar para tirar um cochilo?… Acho que não. Todas as pessoas quer se sucedem bem, seja no que for, muito esforço direcionado por um tempo indeterminado: foco.
Achamos que somos focados. Pensamos que prestamos atenção ao que é importante. Na verdade, estamos constantemente sendo desafiados por vearias distrações, que nos impedem de focar de um modo completo. Quando falamos em autismo, algumas distrações podem ser:
- os amigos que cobram a sua presença
- o olho na próxima promoção no trabalho
- a família que espera a mesma participação em reunioes familiares como era antes
- são as pessoas à sua volta a dizer como deve cuidar do seu filho autista
- a vizinha que reclama do barulho que seu filho faz
- a escola que reclama do comportamento do seu filho
- é a sua dedicação a tudo o que te afasta do seu filho, voluntaria ou involuntariamente.
Foco é a ausência absoluta de distrações.
Planejamento
Planejar é iniciar um plano concreto de desenvolvimento para seu filho.
Quando colocamos no papel (ou no tablet) o que queremos alcançar, este plano começa a se tornar real. Deixa de ser vontade para ser realidade.
Faça um planejamento individual para seu filho. O que você gostaria que fosse modificado no comportamento da sua criança? Tanto o que você quer adicionar, quanto o que você deseja retirar da sua rotina, deveria fazer parte desse planejamento.
Exemplo: Você quer que seu filho ainda não verbal, fale. Planeje. Você quer que ele fale, mas como vai fazer isso? Coloque no papel quantas palavras você acredita ser capaz de ensinar a seu filho em uma semana, um mês, três meses. Que palavras? O que ele mais gosta? Escreva as palavras no seu plano e comece por elas. Não fuja do plano. Seja consistente.
Não misture muitas atividades de uma só vez. Estipule o que é prioridade: deixar de fazer cocô na fralda? Parar de gritar? Aprender a escrever? O que é prioridade no momento? Planeje. Uma atividade de cada vez. Você tanto pode fazer uma rotina de trabalho diária, quanto por ordem de aprendizado – após aprender uma tarefa, passe à próxima (independente do tempo de ensino). Ou divida algumas atividades/ tarefas/ conceitos a serem aprendidos em dias alternados. Escolha o que você achar mais cômodo, porém sendo consequente e sem fugir do que está planejado.
Rotina diária:
As mesmas atividades todos os dias da semana até que sejam aprendidas, passando à próxima que consta no seu plano.
Rotina alternada:
Atividades a serem ensinadas às segundas, às terças, às quartas, e assim sucessivamente.
Aprender Brincando no Play Room (Quarto de Brincadeira)
Depois de ter feito o planejamento (semanal, mensal, anual) para seu(a) filho(a), crie em sua casa um espaço onde irá ensinar e brincar com sua criança. Esse local pode ser qualquer um que seja livre de estímulos:
- livre de sons altos, cores, odores
- mantenha brinquedos dentro de um armeario e somente poucos (três a cinco) brinquedos à vista da criança
- cores neste quarto bem claras, como paredes brancas
- chão fácil de ser limpo
- uma mesinha e duas cadeiras, uma de frente para a outra
- um espelho em frente à mesinha
- tenha certeza de que nnao há objetos quebráveis no quarto
O objetivo é que todos os dias, de preferência, você esteja neste espaço com seu filho por pelo menos 20 minutos. Gradativamente, aumente para uma hora.
Se você trabalha fora, antecipe para seu filho que à noite vocês irão aprender/brincar no local eleito para a co-terapia. Use a comunicação que ele/a entende no momento – pode ser verbal ou alternativa (imagens, pictogramas, PECs, Libras, etc.)
Se a crianca é arredia à ideia de que você quer ensinar-lhe alguma coisa, inicie a sua sessão brincando mais do que ensinando, ou somente brincando. Importante é que ele não deixe este espaço ainda que não queira brincar ou aprender o que você tem planejado para a sessão.
É importante que ele/ela saiba que ali é um novo lugar, onde vocês estarão sempre, ora trabalhando, ora brincando.
Para designar o tempo de brincadeira e o de trabalho, sugiro que usem um relógio de cozinha ou o Time-Timer. Se o treino for estipulado em uma (1) hora, inicie brincando em 4 curtas sessões de 10×5 (10 minutos de brincadeira, 5 minutos de aprendizado). O objetivo é aumentar o tempo de aprendizado e diminuir o tempo da brincadeira.
Seja criativo: faça seu filho/a entender que tem o momento para aprender e o momento para brincar. Por exemplo, coloque um boné na cabeça da criança e diga: “Com o boné na cabeça você é o chefe. Pode decidir o que quiser brincar! (brincar durante x minutos)” Diga também: “Com o boné na minha (sua) cabeca, eu sou o chefe! Eu decido o que vamos fazer! (aprender durante x minutos)”
Não se intimide com alguma crise ou grande resistência da criança à nova maneira de estar com seus pais. Não tenha medo de ocasionar desconforto. Lá na frente, você ficará muito feliz com os ganhos! A criança que nunca trabalhou em casa com seus pais pode não gostar do que é novo. Tenha paciência. Com o tempo acabam por adorar essa terapia. Tenha certeza que você é o brinquedo que sua criança mais quer e precisa.
Ajuda do Terapeuta
Os terapeutas são importantes e o que você aprender com eles será de grande valia nessa hora em particular com sua criança. Peça ao terapeuta uma dica ou sugestão, a fim de se inspirar a exercitar com seu filho atividades que são trabalhadas nas terapias que ele recebe fora de casa. Os terapeutas devem estar alinhados aos pais. Seu apoio vai ser bem-vindo e de grande importância.
Empoderamento
Palavra do ano: empoderamento. Parece que se não estivermos “empoderados”, não contamos na sociedade. Principalmente as minorias, incluindo o autismo, precisa se empoderar. Mas o que é “empoderamento”? Assertividade? Força interior? Coragem? Atitude? Desbravamento? Um pouco de tudo, na verdade.
Enquanto os homens já são considerados empoderados por natureza, as mulheres ainda têm o que conquistar. Mulheres empoderadas – ou mães empoderadas – não se inibem nem têm papas na língua: falam o que pensam, brigam com o mundo para defenderem seus filhos e, muitas adotam o batom vermelho e o salto alto para ratificar seu poder. Falam muito, escrevem nas redes sociais, passam a liderar grupos. Porém, eu peço que me acompanhem numa análise ainda mais profunda do termo “empoderamento”.
Empoderamento é mais do que uma atitude desinibida e corajosa.
Empoderamento é mais do que sair de salto alto por aí e angariar seguidores.
Empoderamento vai além da vontade de parecer forte.
Empoderamento nada tem a ver com imagem.
Empoderamento nunca é de fora para dentro.
Empoderamento é fazer mais do que falar.
Empoderada é a pessoa que entra numa sala com 500 pessoas, de tênis e camiseta e deixa a plateia sentada na ponta da cadeira, fascinada com seu discurso.
Empoderamento é a luz de dentro que brilha forte e se conecta com a do outro.
Empoderamento é um ‘Enfeite na Alma’.
Mães e Pais empoderados são aqueles que tornam o impossível, possível. Eles brincam e ensinam seus filhos sem medo, sem preguiça, sem subterfúgios: “Ahhh eu sou mãe, não sou terapeuta…” Fiquem tranquilos. Somos todos terapeutas. Temos todos a capacidade de ensinar algo a alguém, principalmente a nossos filhos. Temos o potencial de acompanhar, educar e brincar, ainda que estruturadamente – e com um objetivo – com nossos filhos.
Foco, Planejamento e Empoderamento são três atitudes que vão dar início a um processo acelerado e contínuo de conexão com a criança. Conexão esta que vai fazer com que entrem na Twilight Zone, uma zona de sintonia especial, num patamar mais alto, numa dimensão muito pouco conhecida e explorada com a criança, adolescente ou pessoa autista, que é acionada quando pais e filhos interagem sem medo e com total aceitação.
Parte II: As Teorias do Autismo que fazem toda diferença na compreensão e desenvolvimento acelerado da criança, adolescente e adulto autista.
- Fatima de Kwant é radicada na Holanda desde 1985. Especialista em Autismo & Desenvolvimento e Autismo & Comunicação, ativista internacional do Autismo e mãe de um autista adulto que saiu do lado mais severo para o mais leve
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Educar, preparar, empoderar a si mesmo e aos seus entes queridos para navegar e saborear as interações sociais é uma arte…
Fatima, parabéns por produzir e compartilhar ótimos conteúdos.
Namastê!
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Obrigada, William. Fico muito feliz em ver que você tem lido meus artigos.Gratidão.
Fatima